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[Diário de quarentena] De Santa Sara à Xangô, alguns dizeres sobre a fé que sinto

Por Marcela Elisa

Eu tinha por volta de dez anos e lembro das cenas de cantoria para as almas como se fossem hoje. Meu pai, meus tios e alguns amigos pegavam seus violões e saíam pela noite afora cantando na janela das casas de pessoas conhecidas. Eram canções que reverenciavam aqueles que já se foram desta vida e como retribuição, o dono da casa servia um modesto café para que, depois, eles dessem continuidade ao cortejo.

Mesmo frequentando a missa dominical durante toda a infância, adolescência e boa parte da juventude, minhas memórias de fé são trazidas pelos versos melodiosos daquelas madrugadas. Não é raro que eu vá ao meu altar, acenda uma vela, um incenso e me coloque de mãos postas em oração. Me sinto muito bem quando me conecto a esta força que se manifesta no dobrar de joelhos e na abertura para a intervenção divina.

Certa vez, conheci a Delma e ela me disse da presença da Santa Sara em minha vida. Sara é a santa dos ciganos e eu, vinda de um Beraldo que um dia dançou sua ciganice, me senti acolhida por ela e resolvi compor um altar para que eu tivesse para onde me voltar em momentos de necessidade deste abraço maior. E como me dedico a esse altar!

Ele fica em cima de um móvel branco doado pela minha mãe, em estilo rococó com puxador de gaveta em forma de flor. Fica bem na quina da parede, bem no centro da casa. Nele, eu coloquei todo tipo de imagem e símbolo que me levam a resgatar minha confiança de que somos amparados por muitos seres. É frequente quando sinto um desdobrar de mim mesma rumo ao centro da Terra, em camadas de mulheres ancestrais, principalmente. A propósito, é o que sinto agora. Se você olhar meu altar de frente, verá que há diversidade. Como uma rede protetora para os pulos mais ousados, a Santa Sara está no meio, alta, com seu manto azul. Nossa Senhora Aparecida, a carta tirada em algum momento no Tarot das Deusas, meu cartão de visitas que meu irmão Xande ilustrou, uma árvore da felicidade que ganhei na Bahia e a deusa da fertilidade, trazida pela doula no dia que Francisco começou dar sinais de que chegaria. Se você voltar o olhar um pouco mais para baixo, logo notará São Jorge, São Francisco, Buda, Xangô, Oxóssi e Ganesha e um jarro de pedras que ganhei ao longo da vida. De quartzo rosa a uma lajota que Pedro me deu quando viajamos para que eu pudesse conhecer os pais dele. E logo abaixo, na base do altar, tenho o tarot das Deusas, um presente que eu ganhei no aniversário de 34 anos.




Minhas idas ao altar tem sido mais frequentes desde que história do Covid-19 se tornou papel principal em nossa peça de teatro. Vou para agradecer por um dia em que estou forte, confiante e potente em minha raízes grossas e minhas asas de passarinho. E vou, também, em dias de angústia e choro pelo chacoalhão que estamos levando da vida. Lidar com pessoas morrendo nessa magnitude e velocidade me assusta de um jeito tão agudo, que me força a olhar para estes términos impostos e me questionar: do que eu tenho medo?

Acendo um incenso e uma vela. Às vezes danço, às vezes me ajoelho e assim, o espiral serpenteia como uma brisa aveludada ou um tambor ritmado. Eu sei que não sairemos desta situação que nos colocamos, sem antes passarmos pela fé. Não importa se a fé é praticada pelas mãos juntas ou pelas mãos em uma bela inchada.

Aliás, tenho estado em profunda fé também quando cuido das minhas plantas, pinto o portão de roxo ou quando escrevo estas palavras para desaguar o peito, enquanto escuto Cordel do Fogo Encantado e o dia está claro lá fora.

 

"Porque Ele vive, eu posso crer no amanhã."

Por Marina Oliveira


"Porque Ele vive, eu posso crer no amanhã." É o que me direciona todos os dias, em especial nessa quarentena. Somos católicos e meu refúgio sempre foi a missa no fim de semana. Talvez seja a parte que sinto mais falta. É o momento na semana em que coloco meus pés no chão, me reequilibro e até mesmo levo um banho de realidade depois de dias afundada em trabalho ou desperdiçando tempo discutindo com alguém, por exemplo. Ainda que possa falar com Deus em qualquer lugar e qualquer hora (e super abuso dessa facilidade), é na missa que levo minhas sacudidas p/ voltar sempre ao que realmente importa. Nesse afastamento tão triste para quem gosta tanto dessas celebrações, como eu, estamos acompanhando missas pela tv. Longe de ser a mesma coisa. É a cachorra que fica pulando em mim, Lais que resolve gritar e chamar toda hora (não que na igreja ela pare quieta, ne?!), interfone que toca com alguma entrega ou aviso... Mantenho a ideia de ensinar a Lais em toda oportunidade um pouquinho da nossa fé. Ela reconhece o papa e qualquer padre. Faz sinal da cruz e adora falar amém. Entende e reconhece o papai do céu e sempre manda um beijinho. Se diverte com as músicas das orações mesmo sem ter a menor ideia do que significa.

O lado bom é que ela perceba que não precisa estar na igreja para orar e agradecer. E que pode se sentir a vontade para estar com papai do céu onde e quando quiser. Que não tem hora nem lugar. Que simplesmente faz parte da vida dela assim como nós.

Para mim está sendo uma novidade mas que para ela surge como algo que se torna mais natural a cada dia.




 

Fé em Deus!

Por Lívia Macêdo


Antes de iniciarmos esse período de quarentena, eu estava em um processo de dedicação a novos projetos para uma transição profissional. Após 3 anos me dedicando a gravidez e maternidade exclusivas, entendi que estava na hora de viver para mim, além do espaço de tempo que os intervalos de cuidados com minha filha me permitem. E assim era meu momento, estabelecendo parcerias, escrevendo projetos que estão de acordo com meus valores e objetivos de vida, acompanhando minha filha em uma adaptação escolar, resgatando a Lívia mulher que há em mim (além da Lívia mãe).


De repente, meu marido está com a gente em casa, minha filha não pode ir à escola, a faxineira não pode vir trabalhar (por motivos óbvios). Toda aquela produção aquecida, seguindo um objetivo pessoal e profissional vão para segundo plano outra vez. Mais que isso, as pessoas a qual eu estava me juntando passam a vivenciar crises pessoais, intensificadas pela pandemia e buscam reclusão. E todos nós estamos chocados por vermos pessoas, amigos, familiares próximos dando continuidade a vida em outro plano. Além da passagem, por si mesmo, a falta de uma oportunidade de despedida e a simultaneidade de muitas passagens dificulta para quem fica seguir, firme e sem medo.


O medo que falo não é apenas da passagem. Talvez, seja até mais da continuidade da vida na Terra, do que será amanhã, de como nos comportaremos. Medo de ver a fome espalhada ou de ver nossos familiares partirem e de não sabermos como seguir. Medo de não ganhar dinheiro ou de não conseguir aqueles objetivos que tanto almejávamos.


Eu já lutei, já tentei determinar horários para conseguir continuar em busca dos tais objetivos pessoais, tentei até mesmo pensar que “não é tão assustador assim”. Mas pense comigo: se o Mundo parou, será que não está na hora de eu parar também? Eu parei. Respirei. E aceitei.


Aceitei que o momento é sim de reflexão. Aceitei que é hora de abraçar a família. Aceitei que é hora de ter calma, a paciência que tanto falamos. Aceitei que eu sou como eu sou agora. Autoaceitação! Aceitei que, em sendo como sou, posso ter compaixão pelos seres humanos, como eu, e ajudar os que precisam mais que eu. Aceitei também que as coisas não acontecem na velocidade que esperamos. Isso não quer dizer que devo esquecer meus objetivos pessoais, mas de caminhar para estes objetivos, de acordo com meus valores e com compaixão aos que me cercam, aos que também me ajudam e que estão no mesmo momento de reflexão.


Hoje, ouvi que "o ano já acabou". Porém, não posso concordar com essa fala. O ano não acabou, o ano apenas está diferente do que imaginávamos. Veja, moro em São Paulo, e esse ano, não tivemos verão como esperávamos. Minha filha não foi para escola como eu esperava. E eu não consegui o emprego que eu esperava. Mas ainda não chegamos a maio. Ainda há muito para acontecer. Pode ser e provavelmente será que o dinheiro que eu tanto gostaria de ganhar, não venha agora. Porém, certamente, esse ano ainda aprenderei muito. E verei, como uma sociedade fará para se reinventar. Como uma sociedade repensará seus valores e como coloremos esses valores em prática. Precisamos re-significar nossa forma de ver o mundo e entender os possíveis acontecimento de um ano.


E o leitor pode pensar: mas como ser positivo em um momento que há tanta coisa estranha acontecendo, com tantos grupos objetivando coisas diferentes, com tanta desigualdade?


Para isso, a resposta é única: Fé! Neste quesito eu agradeço por confiar em Deus. E independente da religião que o leitor siga, tenho certeza que Deus é um ser bondoso e justo. Deste modo, Deus não deixaria que acontecessem coisas que não fossem boas e que não tivessem sua aprovação. Fé para entender que mais forte que sejam todos os estranhos acontecimentos, Deus busca um equilíbrio e a evolução humana. A princípio, podemos não ver os resultados positivos desses acontecimentos, mas observe como as pessoas se tornaram mais prestativas, observe como vários animais reapareceram em lugares que não eram mais vistos, observe como o ser humano (em grande parte) entendeu que não é possível viver apenas para si e de um modo tão privilegiado.


Com fé, ressignificação e autoaceitação tenho seguido. Entendi, depois de conversas familiares, que é hora de viver o agora, da melhor forma possível, impregnando nossas ações com todo o valor pessoal que temos, com compaixão aos amigos e aos seres humanos em geral.

Poxa mas tenho que esquecer meus objetivos? Claro que não! Apenas ter paciência para fazer o possível hoje. Talvez, a casa fique de cabeça para baixo. Talvez, os projetos sejam adiados. Talvez, (e provavelmente) veremos coisas que discordamos. Talvez, o dinheiro acabe. Talvez, os objetivos mudem. Com fé em Deus, sabendo que Ele está acima de todos nós e é benevolente, soluções chegarão até nossos braços e conseguiremos re-significar nossas ações para alcançarmos a evolução humana e social.



A propósito, hoje é 23 de abril, dia de São Jorge. O tema dos textos de hoje não foi pensado para esta data. Foi uma coincidência! Tenhamos Fé!

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