Quando eu engravidei do Francisco estava no meio do mestrado. Mesmo imaginando que seria um caos conseguir levar os primeiros cuidados com meu bebê e a escrita da dissertação, lá no fundo, eu sentia que todo o processo entre engravidar, parir e cuidar seria mola propulsora para a riqueza do texto.
O tema do meu mestrado gira em torno das formas como a autonomia aparece (ou não aparece) no âmbito escolar. Para fazer a pesquisa, escolhi uma metodologia chamada Fenomenologia que, em grossas linhas, julga a verdade como sendo o retorno às coisas mesmas, exatamente como elas se mostram. Conforme fui caminhando e adentrando esse território da academia, até então desconhecido por mim, fui notando que não havia escapatória: eu viveria situações que me colocariam frente a frente ao que eu pensava ser a tal da autonomia.
E assim, começava a aventura: grávida e mestranda. Logo no começo, quando decidimos parir em casa e com parteiras, no documento que assinamos (nos co-responsabilizando pela escolha feita), estava lá a palavra mágica: “este parto respeita a autonomia da mulher”. Mas que seria isso? De que autonomia estava falando? E lá fui eu...entre livros, marcadores de texto e uma barriga que crescia enquanto eu, aos 6 meses de gestação, defendia a qualificação.
A esta altura, eu começava a perceber que a autonomia na qual eu me debruçava dizia a respeito de uma construção incessante. Quando eu me tornava autônoma em algo, outro algo surgia e eu ainda não tinha a autonomia sobre esse algo. E nunca parava. Sabe porquê? Porque fui vendo que esta tal autonomia além de estar em construção, também dependia da relação que se estabelecia entre pessoas, entre lugares e pessoas, entre coisas e pessoas. Explico: Conforme o Francisco foi crescendo (na barriga e fora dela), ao mesmo tempo em que eu o impactava com minha maneira de me relacionar, ele também me impactava com a dele. E assim, íamos construindo a presença necessária para que a autonomia aparecesse.
E o parto, e a amamentação, e os desafios dos primeiros meses, e a troca de olhares. Não dá para dizer que sou a mesma pessoa antes de ter o Chico comigo. Sou totalmente outra! E isto é uma das formas de estar praticando a autonomia, creio eu.
O que acontece é que ainda não terminei meu texto de mestrado, já que o defendo em Fevereiro de 2020. Minha tentativa, aqui, neste canal e com estas palavras é duplo: fazer raciocinar como a vinda do Chico me impele a escrever cada vez mais profundamente sobre o tema que escolhi e desabafar. Isto mesmo! Levar um mestrado e cuidar de um bebê de quase 1 ano é desafiador, animador e enlouquecedor. Há horas em que eu estou totalmente nutrida de ideias, insights, alegria. Noutras, sou o tédio, o cansaço e a pressão do tempo.
Viver esta experiência de mestrado com o Francisco no colo é tão animador como desanimador. Por um lado vejo a potência que a maternidade me trouxe no que tange as conexões que faço e o propósito de um presente e futuro melhor para meu filho; do outro lado, oposto e complementar, sei que se não tivesse meu menino tão dependente, poderia me dedicar a ler os livros de 500 páginas e o texto talvez fosse muito mais denso e reflexivo. Mas é isso. Lido com minha realidade da maneira que consigo. Vivendo. Sendo autônoma e desautônoma. Autônoma e desautônoma. No balanço, sempre.
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